E se eu me entregasse? E se eu me
conformasse com o mundo em que vivo e mergulhasse de cabeça nessa realidade
transitória? E se eu me desapegasse das coisas que hoje eu acho fundamentais e
verdadeiras e começasse a caminhar rumo ao mundo que todos vivem? Eu largaria o
que faço, teoricamente por prazer, e iniciaria atividades para me agregar mais
e mais à rotina determinada pelo sistema. Estudaria as nuanças requeridas para
escalar até o cume que me seria determinado, pois há um limite lógico do que se
pode ou não fazer nesse estado de subvida. Seria admirado por pessoas que
também bebem dessa fonte, viajaria para lugares distantes, para me alimentar de
informações pertinentes para poder fazer as engrenagens continuarem funcionando
exatamente como o previsto. Acordaria nos mesmo dias, para andar sobre os
mesmos calçados, para assistir as mesmas cenas, para proclamar as mesmas
orações, para receber em troca disso uma quantidade fixa de algo virtual e
convencionado como necessário para sobreviver. Talvez um dia, depois de vinte
ou trinta anos, eu estivesse em alguma posição respeitável aos olhos da massa.
Me apegaria certamente a alguns prazeres fugazes para poder segurar a onda
dessa arrebentação constante, e no fim, tudo sairia como o que sempre foi, é e
será para os que vivem assim. Poderia encontrar alegria nisso. Tenho minhas
dúvidas. Mas do que adiantaria essa dança toda, se tudo isso não passa de uma
realidade transitória? O contra ponto a isso é o desejo de viver algo diferente
e me entregar de fato ao que me agrada como tarefas cotidianas. Sempre achei
que se tratava de como nos enxergamos e do que valorizamos de fato em nossa
jornada. Mergulhar de cabeça nessa convicção é muito mais difícil, pois a
plataforma de saída é bem mais alta. Ela esta alocada em um lugar onde muitos
gostariam de ir, mas que o senso comum tenta nos convencer que é inalcançável e
perigoso. Sedutor para uns, ameaçador para outros. Viver esse risco é desafiar
os próprios conceitos enraizados nesse mundo estranho. Pode ser que no final, esse mergulho se
transforme em uma tragédia, pontuada por alguma rocha oculta pelas águas dos
sonhos. Uma coisa eu sei, não o fazer é ir contra tudo que acredito, é ir
contra quem eu sou, é desistir de ser alguém de fato, e de viver uma realidade
transcendente, não transitória.
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